Exercer a compreensão é uma das tarefas mais difíceis. Porque compreender, pra variar, é aceitar as coisas como são, confiando que de alguma forma, elas fazem algum sentido. Compreender é difícil porque exige desapego de nossos conceitos das coisas, quase sempre idealistas demais. Sair julgando e condenando é beeeeem mais fácil.
Cheguei a essa conclusão conversando com minha mãe outro dia. Temos uma parente que teve dois filhos e os largou. Simplesmente sumiu e os deixou com outros de nossos parentes. Era casada mas o rapazinho era meio devagar também, não aguentou o tranco e foi para as drogas. Ela, como eu disse, sumiu. Antes disso já não parava em emprego nenhum. Dizem que agora está com um taxista que a sustenta. E pasmem, está grávida de mais um filho.
Assustador, não? Todos nós, os parentes, a condenamos de todas as formas. Como pode? Uma mãe fazer uma coisa dessas? Bla, bla, bla…
Mas hoje, por mais estranho que possa parecer, eu entendo o que acontece:
Essa moça é mais uma das tantas pessoas nesse mundo para quem a vida é um fardo pesado demais. Ou você acha mesmo que todos tem a obrigação de ser tão fortes quanto você? Acredito que muitos a quem costumamos julgar de vagabundos, vivem esse drama interno. Não quero necessariamente eximir a moça aqui citada de sua culpa e responsabilidade. Mas pense comigo, acho que todos nós, em alguma esquina da vida, já paramos e percebemos que a vida é por demais complexa e exige de nós muito além do que estamos internamente dispostos, ou preparados, para dar. Certas exigências sociais simplesmente não fazem nenhum sentido para nós, por mais que façam sentido prático, como sustentar a si mesmos.
Boa parte das pessoas, depois da crise e de muita reflexão, prefere continuar. Segue adiante, trabalhando, fortalecendo-se e seguindo a vida. Uma pontinha de orgulho e uma persistente esperança as faz concluir que é melhor seguir em frente do que jogar a toalha e se abrigar novamente com os pais, parentes ou qualquer um que resolva nosso problema do sustento.
Não foi o que aconteceu com a moça em questão. Seu propósito interno é tão fraco, tão insuficiente para arcar com a responsabilidade de dois filhos e ainda ter que trabalhar, que ela simplesmente sumiu. Aquilo era demais e a consumiria por dentro de tal forma que acredito eu, mais alguns anos e ela esmoreceria, vindo a parar nas ruas, nas drogas ou em qualquer situação precária.
Preferiu encontrar quem a sustentasse. No início eu vi tudo isso com o mesmo espanto com que você pode estar sentindo ao ler essa história. Contudo, hoje, eu simplemente compreendo. Há pessoas, e elas são muitas, que devem ser sustentadas, porque lhes é tarefa demasiado pesada sustentar-se. Não que não possam vir a dar conta da própria vida futuramente. entretanto, AGORA, não têm recursos emocionais suficientes para tanto. Esse ponto de vista explica também porque muitas e muitas pessoas só desabrocham na vida depois de uma certa idade.
Aprender a viver leva tempo.
E é assim que a vida é, e é assim que a vida segue, nos mostrando tal realidade através de seus próprios caminhos e eventos, tais como o que acabei de descrever. A observação atenta do que acontece ao nosso redor nos mostrará que a vida e seus caminhos ignoram todo o preconceito que possamos manifestar. Julgar qualquer ato que seja, sem sentirmos na pele o que sente o sujeito que julgamos, é sem dúvida um dos piores erros que podemos cometer.
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