Há algum tempo escrevi sobre uma percepção; a percepção de que o que conhecemos por “história” nada mais é do que uma descrição testemunhal de alguém sobre um determinado fato. Uma descrição apenas. Uma de muitas. A realidade fiel dos fatos historicamente narrados a nós, só Deus sabe como foi.
Hoje temos o fenômeno recente das fake-news, que vai muito além do que se entende por notícias falsas.
Existem as notícias falsas, isto é, comunicação equivocada de fatos não existentes ou ocorridos de forma diferente da divulgada.
Exemplo: “Maria foi vista fazendo compras na feira.” Perguntada, Maria diz que não estava na feira. Quem viu certamente se confundiu
E existem as narrativas de um fato: “Maria foi vista fazendo compras na feira, mesmo estando desempregada”. Percebe? Há uma imputação de juízo sobre o ato de maria. Talvez ela tenha ido a feira. Talvez esteja mesmo desempregada. Talvez tenha pedido dinheiro emprestado. Mas o que a narrativa quer demonstrar é que Maria é desonesta, afirma que está desempregada mas vai fazer compras. Quem lê, fica com um pé atrás a respeito de Maria. Será que ela é confiável?
O Monopólio da Verdade…
As pessoas têm uma propensão natural a acreditar no que outra pessoa diz.
Nascemos com uma inclinação a presumir honestidade nas falas dos outros.
Esta inclinação é ainda maior quando o que se fala parte de um agente da mídia: Apresentador, locutor, jornalista, escritor ou algum outro comunicador qualquer.
Nascemos ignorantes, estudamos muito pouco na vida, estudamos mal o que sabemos, sabemos muito pouco da realidade.
Qualquer um que se apresente sabedor, que articules palavras e ideias mais complexas, ganha automaticamente o respeito das massas como o portento detentor da verdade.
Toda essa briga contra fake-news é uma briga pelo MONOPÓLIO da verdade, propagada através de narrativas, que até então pertencia aos grandes conglomerados de mídia e que correspondiam aos interesses de determinados grupos que essa mídia representava.
…ou Monopólio da Mentira?
Sabendo dessa credibilidade espontânea, da inclinação das pessoas a aderirem a qualquer narrativa propagada por seus veículos, a imprensa passou a se prevalecer deste poder de manipulação das massas para conduzir a opinião pública de acordo com interesses diversos.
Hoje está mais esclarecido que:
A imprensa tradicional sempre mentiu; sempre mentiu MUITO.
Eis porque a primeira medida de governos ditatoriais é controlar – e se possível extinguir – a imprensa.
Se perco o controle da imprensa não aguentarei no poder nem por três meses. Napoleão Bonaparte – Imperador Francês
E recentes, veja a desconfiança do Silvio Santos sobre jornalistas:
Nós temos uma tendência a crer que se algo foi publicado num jornal, ou foi dito por um homem de terno as 20:30 horas na Globo, então é verdade.
Nem sempre é. Aliás, quase nunca o que foi publicado ou dito retrata com fidelidade a realidade.
Jornalistas deveriam, por ofício, tão somente informar e relatar fatos, da forma mais isenta possível.
Porém o que se viu até fins do século XX foram veículos de imprensa narrando o mundo de acordo com as mentes de seus dirigentes.
Porque além de atenderem aos interesses de seus patrões, jornalistas têm sido convencidos, ou doutrinados, pelas faculdades de ciências humanas, de que eles têm obrigação de tornar o mundo melhor. Aquela conversinha idealista, como se tornar o mundo melhor fosse tarefa fácil, como se o conceito de mundo melhor fosse o mesmo para todos.
O fato é que, atualmente, praticamente todos os jornalistas saem das faculdades mais graduados em militância do que em informação.
E como todo revolucionário, para quem os fins justificam os meios, eles mentem descaradamente se preciso for, porque na cabeça deles, é por uma boa causa: a revolução.
É o que eles têm feito atualmente em relação ao isolamento social. Dizem pro povo ficar em casa, e patrulham o povo que não fica, e as pessoas têm perdido emprego, têm passado fome por causa disso tudo. Tudo para o seu bem.
Mas a propagação das fake-news agora deixou de ser monopólio dos grandes grupos de imprensa, e foram parar nas mãos das pessoas comuns.
E aqui vemos que as fake-news possuem algumas características curiosas:
1 – A condição de quem propaga
A propagação de uma informação ou narrativa falsa, pode partir de alguém ignorante, que interpreta mal os fatos, ou de alguém de má-fé, que lança uma interpretação específica e proposital no ar, com determinados objetivos; defender uns, atacar outros.
Eu vou dar um exemplo. Aqui em praia próxima, um rio que estava represado pela areia da praia, durante longa estiagem, desembocou no mar. E toda uma água enegrecida, podre de folhas caídas, animais mortos dos pântanos (mangues) por onde o rio corre, corria com força para o mar. Pescadores locais filmaram e, sem qualquer certeza do que diziam, acusavam algumas poucas casas, vistas de onde estavam, de estarem jogando esgotos no dito rio. E falavam com a raiva de quem tem certeza do que está dizendo. Mas não tinham certeza.
Porém essa foi a narrativa que foi propagada pelo videozinho que circulou. A secretária de Meio Ambiente local veio a público e explicou todo o contexto, relembrou as ações drásticas de saneamento pelas quais a cidade tem passado, mas com muito menos visibilidade. Resultado?
A maioria do povo que teve contato com o ocorrido, ficou com a noção de que a versão dos pescadores é real.
2 – A condição de quem recebe
Aqui temos uma maioria de pessoas leigas, desinformadas e ignorantes – e digo aqui ignorante no sentido mais compreensivo do termo – ninguém tem obrigação, nem conseguiria, saber de tudo.
E para além da ignorância e desconhecimento geral de tudo da maioria, tem a questão das crenças.
Crenças e Fake-news
A questão das crenças pessoais, fundamentadas em interesses particulares, está intimamente ligada às fake-news.
Há uma ironia sobre o assunto que diz:
Se eu acredito, então é verdade.
E isso revela o pântano mental em que nos encontramos. As pessoas não pensam por conta, têm dificuldade de pensar por conta, não gostam de questionar as próprias crenças. Então qualquer coisa que recebam não é filtrado pela peneira da razão, é sim filtrado pela peneira do sentimento.
Se a informação / narrativa que recebo no whatsapp me faz sentir bem, então presumo que é verdade.
Se a informação / narrativa que recebo me faz sentir mal, então presumo que é mentira.
Pouco importa a realidade.
Importa o que eu acredito que seja a realidade.
Inversão Semântica
Antigamente, você tomava o poder apontando uma arma na cara das pessoas.
Hoje você toma o poder enganando-as que o que você faz é bom pra elas, quando na verdade, é ruim pra elas, e bom pra você.
Como comentei acima, o povo é constituído por uma maioria de pessoas leigas, desinformadas e ignorantes.
O cidadão médio não sabe definir exatamente o que é democracia, o que é autoritarismo, o que é progressismo, o que é conservadorismo.
O povo não sabe direito o que são essas coisas.
Qualquer coisa que você dizer, com um ar de quem sabe o que diz, vai ser verdade para essas pessoas.
Sendo assim, os ideólogos e os poderosos se prevalecem dessa ignorância inata do povo, para dominá-lo.
Utilizam da inversão semântica. Tem acontecido muito atualmente:
Governos forçam o povo a ficar em casa, perdendo emprego e o sustento. Mas é pelo bem dele.
O STF tem reprimido a livre expressão das pessoas, numa postura claramente autoritária, e diz que é pela democracia (democracia, aqui, significando o salário deles).
Bolsonaro defende o direito de ir e vir das pessoas, quer que o povo vá as ruas trabalhar, numa atitude claramente libertária, mas tem sido tachado de autoritário, de fascista.
Há um slogan comunista que diz:
Acuse-os do que você faz; xingue-os do que você é.
Esse slogan é atribuído a Lenin, provavelmente não é dele, mas resume bem a insanidade ideológica do esquerdista:
Trabalham com inversão semântica: Chamam de conservador quem prega a liberdade individual. Chamam a si mesmos de progressistas pregando o intervencionismo (controle) do Estado sobre tudo.
O fascista se auto-intitula anti-fascista.
O autoritário se auto-intitula democrático e assim vai.
Isso vai além da fake-news, é um trabalho de implementação de narrativas ideológicas de como o mundo é, quando na realidade o mundo é o contrário do que a narrativa prega.
E normalmente a narrativa prega que o que se faz é bom para o povo, quando na verdade é bom para quem prega.
Lei das Fake News
Temos agora essa polêmica lei das Fake News, que estão cogitando votar.
O que motivou a criação dessa lei foi uma confusão a respeito do próprio termo fake news.
Confusão de seus próprios idealizadores, pessoas com certa idade, com dificuldade natural de entender o mundo digital.
Há uma confusão entre o que é fake news, isto é, uma informação falsa, uma narrativa que visa explicar um fato de acordo com certa visão ideológica e motivada por certos interesses – coisa que os políticos idealizadores da lei usam até mesmo para si – e o que é essa propagação de xingamentos caluniosos, debochados e irresponsáveis nas redes.
Eu me considero de Centro-direita, não sou adepto do sentimentalismo humanitário abraçado pela esquerda, mas eu mesmo fico estarrecido com o modo como direitistas abusam da liberdade de expressão para xingar, debochar, criar apelidos menosprezantes em seus opositores. Acho até que é uma péssima estratégia política, porque gera reação, ressentimento, rancor dos opositores, e acentua a divisão na sociedade.
Até mesmo por princípio, não acho necessária a criação de uma nova lei. O Brasil já tem leis demais. Leis que emperram o nosso progresso.
Temos inclusive leis suficientes que garante o reparo moral para quem se sinta ofendido diante de manifestações alheias.
Então não precisamos de uma nova lei de fake-news.
Precisamos sim, usar as leis que já temos.
Caluniou, injuriou?
Processo!
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