Comecei a comentar um post que falava da preferência recente de palestrantes para que seus ouvintes desliguem os celulares durante a apresentação e se concentrem na palestra. Como o comentário se estendeu bastante, decidi publicá-lo aqui:

Não dou palestras mas entendo a situação. É angustiante falar a quem nos devolve desatenção. Como toda essa tecnologia é muito recente, muitos ainda não aprenderam (e vão demorar pra aprender) como lidar com a própria atenção em relação a essas ferramentas online. Há alguns meses, durante uma peça de teatro, mesmo apesar de ter sido solicitado que os celulares fossem desligados, a mulher ao meu lado (tinha que ser ao meu lado) não só não desligou como o atendeu durante a peça, tentando falar baixinho. É claro que perdi a concentração na peça e é claro que ouvi toda a conversa e pude perceber que não era nada importante. Além da falta de educação, o que mais justificaria essa impossibilidade de se desconectar por uma breve hora?

Além disso, penso muito nesse assunto e me incomoda o quanto estamos todos viciados em conexão, sendo que nenhuma conexão nos acrescenta TANTO assim. Tenho admirado cada vez mais alguns conhecidos que nem têm perfil no Facebook. Suas vidas seguem tão ricas e até mais intensas do que quem está online, porque na verdade não lhes falta o que fazer da vida. Pois sabemos que muito da presença online das pessoas se resume a entretenimento, por tédio e falta do que fazer, e também por preferir a segurança do online do que a exposição que as atividades offline exigem.

Quando o twitter surgiu me pareceu uma grande imbecilidade. Até tentei usá-lo e não fui bem sucedido. Um tanto por incompetência certamente, mas outro tanto porque é uma ferramenta tão nosense com tanta gente nosense por lá que me desagradava me nivelar a eles. A ideia de Saramago de que o twitter é um retorno do ser humano ao grunhido pré-histórico sempre me soou certeira. Não quero fazer parte daquilo.

Agora tenho sentido o mesmo pelo facebook. As pessoas ali expõe tantas coisas bizarras e medonhas, muitas sobre si mesmas, outras reclamam de forma vitimista, outras vêm com suas lições diárias de auto-ajuda (sem conseguir pô-las em prática), que me desagrada estar junto delas. E quando tentamos expor algo mais elaborado, a maioria nem entende

E tudo isso a troco de quê? É um despropósito que gente como nós, que vivemos da produção de conteúdo, fiquemos publicando conteúdo demais no Facebook ou acompanhando as tretas do twitter, onde temos pouco ou nenhum retorno. Pois a quantia de visitantes que o Google traz para os meus sites é exorbitantemente maior do que o número ínfimo de pessoas que me acessam por essas redes.

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Há vários meses, fui até uma borracharia aqui perto, onde um tiozinho nos atende de roupa social batida e chapéu indiana jones. Sua especialidade é fazer o balanceamento das rodas fixadas no carro. É uma figura hilária. Sua oficina é uma típica oficina dos anos 80, bastante improvisada e simplória. Seus instrumentos são artesanais e provavelmente foi ele mesmo que fez. Lá não há televisão, nem computador. Apenas um radinho e um simpático gatinho com a cauda amputada que dorme preguiçoso dentro de um pneu velho.

Enquanto ele resolvia o problema do meu carro, e demorou bastante pra ele conseguir resolver, eu fiquei pensando junto ao vento que soprava leve e sem pressa por ali, que liberdade boa que o tiozinho tem ali. Sua vida profissional é a mesma que iniciou nos anos 80. Não há computadores pra lhe chamar e muito menos pra lhe prender a atenção… com temas irrelevantes.

Por instantes, invejei a liberdade que a circunstância de vida daquele homem permite à sua atenção.