Ontem a noite larguei um pouco desse mundo online que se apossa da nossa alma, e fiquei um bom tempo, em silêncio, refletindo e tentando passar a limpo, mentalmente, algumas questões pessoais que insistem em se fazer presentes por aqui.
E durante esse processo de reflexão, me dei conta (novamente, porque na verdade relembrei que já tive esta conclusão há um bom tempo), que eu tenho vivido a maior parte da vida sob um péssimo padrão emocional de ansiedade, porque vivo o tempo todo com uma constante sensação de insatisfação e descontentamento geral com praticamente toda a minha realidade * …
…porém, sem me dar conta deste estado pessoal na maior parte do tempo.
Exageros à parte, o fato é que eu vivo praticamente todos os meus dias com a esperança focada em algum ponto do futuro onde tudo dará certo e ficará bem, quando sentirei pela primeira vez o que eu poderia chamar de alívio existencial (percepção esta que faz lembrar muito a mensagem de Eckhart Tolle em seu livro O Poder do Agora).
Vivo uma espera interminável, dia após dia, de que aconteça algo que alivie meus tormentos. E esse “algo” já foi tantas coisas, tantas intenções que vieram sucedendo-se ao longo dos últimos vinte anos, tantos amores, curas, santos graais, milagres e eldorados, que hoje já não sei exatamente o que espero, só sei que espero!
Pois é, VINTE anos […]
Voltando para trás em minhas lembranças, percebi que esta sensação de insuficiência e ansiedade começou lá pelos meus onze anos de idade, quando algo que eu queria muito não deu certo e a partir de então passei a esperar por esse acontecimento dia após dia, por anos a fio. Quando esta intenção não se mostrava mais possível, me apoiei logo em outra, sempre esperando passivamente que um dia acontecesse. E assim vim pulando de galho em galho até hoje, sempre esperando. Hoje, de modo já um tanto inconsciente, mantenho esse tipo de padrão, um padrão emocional ou psicológico entranhado (ui) de esperança de superação, ou libertação, para um dia qualquer do futuro, que nunca chega… …e talvez claro, nunca chegará.
Mas o que percebi ontem a noite, é que apesar desta condição ter origem psicológica, se expressa em toda minha fisiologia corporal de modo quase imperceptível. Ora, de onde vem esta ansiedade cada vez maior, esta impaciência crônica, esta incapacidade, de longa data já, de não conseguir focar no presente, no arredor, sempre com a mente distante, em alguma obrigação, em algum compromisso, em alguma busca, em alguma esperança, em algum sonho, em algum fim.
Eu resumiria esse padrão por um muito querer algo que é praticamente impossível. E essa sensação de impossibilidade gera um sentimento de impotência que ressurge de tempos em tempos e que transforma o meu dia a dia num verdadeiro tormento. Tormento que promove(u) uma busca incessante por alguma forma de eliminá-lo, quase sempre através de algum tipo de fé, praticamente sempre à espera de algum tipo de milagre.
O desejo é a mais comum das prisões, porque permite um auto-aprisionamento suave, gradativo e espontâneo. Entretanto, é ainda uma prisão, porque desejar as coisas é estar submisso à posse delas. Primeiro, aprisiona-se à expectativa de conseguir o que se deseja. Depois, aprisiona-se ao medo de perder o que se obteve.
Estou falando aqui de uma percepção muito minha, e só assumo essas conclusões publicamente porque sei que praticamente todas as pessoas sentem o mesmo, em algum nível. Não me é difícil imaginar que isso aconteça em maior ou menor grau com você também, porque vivemos numa sociedade consumista que nos estimula a desejar o tempo todo: objetos, pessoas, condições e status pessoais, experiências… Muito raramente nos encontramos em paz com o que somos e com o que temos.
E aqui chegamos a palavra que resume toda esta fala: PAZ.
Viver esta vida ansiosa, de espera interminável, é um tormento, uma guerra interior. E a conclusão da reflexão que inspirou este texto, é que apesar de viver momentos de alienação e anestesia mental, envolvido por algum compromisso que me distrai de mim mesmo, de modo geral, posso dizer que a (minha) vida é um angustiante e infindável tormento; Que muito raramente experimento esta paz de espírito, aquela paz de quem não quer nada porque se satisfaz com o que tem, tanto em termos de bens materiais, como principalmente, em termos de integridade pessoal (saúde, autoestima, talentos).
No fim de toda esta reflexão, lembrei de uma passagem budista que já citei aqui algumas vezes:
O discípulo suplicou ao mestre: “Mestre, eu quero paz“. E o Mestre respondeu: Tire o eu, depois tire o quero, e você ficará com a paz.
O segredo, me parece, é não querer.
Se as portas parecem fechadas é porque seus desejos são muitos. Se não tivesse nenhum desejo, não notaria as portas fechadas.
***
O segredo para melhorar a autoestima é abaixar suas expectativas até o ponto onde você já está.
D.
21 de julho de 2015 as 1:09
Olá Ronaud, nossa, eu realmente precisava ler esse texto hj… Passo exatamente pelo que vc passa, e realmente é um tormento… É a primeira vez q comento, mas faz tempo q leio seu site e seus textos, e realmente admiro sua lucidez, eloquência e sabedoria… Seus textos já me ajudaram mto em vários momentos, agradeço a vc por isso, e peço q continue sempre escrevendo e publicando seus pensamentos, opiniões e conclusões sobre a vida… Com certeza vc ajuda mtas pessoas que se identificam com o que vc escreve, e eu sou uma delas… Gosto principalmente quando vc aborda temas sobre autoestima, amor próprio e autoconfiança, que são os principais itens para sobreviver nesse mundo, porém bem difíceis de alcançar… Enfim, desculpe o comentário extenso, realmente espero q vc alcance sua paz de espírito e agradeço pelo texto brilhante!
Ronaud Pereira
21 de julho de 2015 as 13:41
Opa! Muito obrigado por suas palavras. É sempre bom relembrar que minhas exposições continuam ajudando as pessoas. Obrigado mesmo, e boa sorte por aí! 😉
clovis
22 de julho de 2015 as 3:56
Olá Ronaud
Pois é, já notei há algum tempo que tenho esta mesma sensação. É um sentimento esquisito este, as veses quero estar em algum lugar onde parece que está acontecendo algo mais interessante “quando na verdade não está”, em outro momento me pego pensando no futuro e vivendo naquele pensamento quando na verdade estou no presente “sem estar”. Enfim, parece que fomos programados para sempre estarmos distraídos do momento agora e pensando no momento amanhã. Existe uma falsa sensação se que algo melhor nos espera lá adiante, o pote no fim do arco-íris. É somente uma ilusão. Como você mesmo disse esta sensação se manifesta em diversas escalas, no meu caso por exemplo posso dizer com propriedade que vivo mais preocupado com o futuro do que com o presente. Esses dias atráz fiz uma experiência bem interessante. Parece simples mas foi uma coisa quase que mágica. Primeiro começei a notar que nos momentos que estou fazendo qualquer atividade nunca estou 100% focado nela, então decidi me dedicar de corpo e alma que eu iria me desligar de todos os pensamentos da minha mente e prestar atenção somente ao momento que eu estaria vivendo determinada situação. Então escolhi a hora do banho, resolvi prestar total atenção aquele momento e o que notei foi que É MUITO BOM TOMAR UM BELO BANHO QUENTE. Ou seja, quando você se desliga de tudo e de todos e passa a prestar atenção no momento presente, na sensação da agua caindo em seu corpo, no prazer que isso proporciona, no cheiro suave do sabonete, todos os problemas desaparecem e ali se torna um momento onde você curti o que a vida tem de bom a oferecer. Isso pode ser feito de várias maneiras, quando se está almoçando, repousando, ouvindo música etc. É uma experiência sem igual. Bom seria se conseguissi-mos viver a vida de forma plena com mais frequência, mas acredito que a prática pode tornar estes momentos mais frequentes.
Expectativa é uma palavra que nos frusta e muito, por isso devemos tomar muito cuidado com essa palavra no nosso cotidiano. Conforme diz uma frase que vi uam vez: ” não crie expectativas. Se você não espera que nada aconteça você não se decepciona, Se você não espera nada e algo acontece, você se surpreende”.
Abraço
Ronaud Pereira
22 de julho de 2015 as 23:31
Legal seu comentário. Eu ri com o exemplo do banho porque tbm é algo que me chama a atenção por aqui. Às vezes só tenho a lembrança de entrar e de sair do banho porque durante viajei pra algum lugar qualquer, distante no espaço e no tempo tentando resolver algum problema mentalmente. Mas como você, também consigo, às vezes, vivenciar esses momentos no presente, como almoçar ou passear de carro. Considero um bom exercício. Um abraço!
Rosemille Alencar
24 de julho de 2015 as 8:24
Ronaud, achei esse texto interessante, aliás como todos os que você produz…
Bom.. comigo perco momentos gratificantes no presente não por pensar no que de bom o futuro me proporcionará mas no que de ruim.. ( coisa tosca ) e por conta disso o que eu considero o bom agora, não curto, por estar sofrendo pelo que pode me acontecer de ruim no futuro.
Ronaud Pereira
24 de julho de 2015 as 13:22
Obrigado, Rosemille! Imagino o tormento que você vive sempre com medo de que o pior aconteça. Cada um com sua neura particular 😉
Mari a José Colares
03 de fevereiro de 2018 as 22:01
Hoje estou exatamente igual ao seu texto,parece q vc mergulhou dentro de mim e fez uma viagem no corpo quase morto é assim que me sinto…
Pressionada em todos os aspectos, nada é tanto faz.