Eu tenho plena convicção da existência de algo a mais, de caráter espiritual, em relação à dimensão física na qual vivemos.
A existência humana e universal são complexas demais (além de intrinsecamente improváveis), e por isso mesmo, é um ato de coragem afirmar categoricamente que somente existe o que pode ser detectável por nossos sentidos ou nossos instrumentos tecnológicos. Mesmo as coisas invisíveis porém detectáveis tem algo de mágico, como o som, o ar e o magnetismo.
O que se dirá do que é indetectável, como a força da vida, a abstração contida nos pensamentos e os milagres dos quais estamos sempre ouvindo falar ou, eventualmente, vivenciamos?
Mas mesmo acreditando profundamente que existem dimensões inexoráveis da existência, sempre que me deparo com algum espiritualista se atrevendo a explicar como é ou como não é o lado de lá, e pior ainda, quando esse espiritualista começa a dizer que para acessar essas dimensões você tem que fazer isso ou aquilo, isto é, condicionar esse acesso a regras morais (só vai pro céu se for bonzinho), um alerta bem amarelo de desconfiança começa a piscar em volta da minha cabeça.
O fato de cada religião ou segmento espiritualista ter uma interpretação própria do mundo espiritual confirma: Muitas pessoas têm experiências marcantes envolvendo algum tipo de experimentação nessas dimensões insondáveis da existência, o que valida as experiências por si mesmas, mas como essas interpretações do que se viveu são muito diferentes entre si, mostra que ninguém é capaz de passar aos outros, com precisão, a natureza do que vivenciou.
Por isso, sempre desconfio de gente que tenta demonstrar saber demais sobre essas dimensões espirituais cujo acesso é na verdade bastante limitado e impreciso. Quanto mais autoridade a pessoa se auto-atribui, e quanto mais solene for o tom com que tenta passar suas visões sobre como é o “mundo espiritual”, mais desconfio.
Acredito mesmo que algumas pessoas possuem o dom da canalização de manifestações de entidades espirituais. E mesmo assim, nem nessas entidades eu acredito, porque se observarmos com certa frieza, o que falam nada mais são que palavras bonitas que dizem muito pouco de relevante a não ser obviedades e platitudes.
Por isso, ao longo do tempo venho colecionando algumas pontuações sobre incoerências entre o que espiritualistas propagam e o que seria de se esperar que propagassem (essas pontuações serão atualizadas e melhoradas ao longo do tempo):
Espiritualista de Esquerda
Na política, normalmente os esquerdistas simpatizam com o Materialismo filosófico e histórico, e, portanto, tendem a ser totalmente céticos, descrentes e desconfiados, e quase sempre, ateus. A ampla maioria dos intelectuais é de esquerda, e é ateia, ou amplamente cética. E, dedutivamente, dentro desta visão de mundo em que só existe o que pode ser observado, passam a acreditar que os mais fortes devem ajudar os mais fracos; e que os mais fracos são vítimas da crueldade do mundo, ou dos mais fortes.
Para os materialistas filosóficos, e portanto, para a ampla maioria dos esquerdistas, todas as circunstâncias humanas são fruto do acaso.
Normalmente os intelectuais são os mais céticos porque têm pouca sensibilidade espiritual. E por outro lado, para complicar, as pessoas mais sensíveis às dimensões espirituais são as menos propensas ao raciocínio lógico, e acabam acreditando em qualquer ideologia que lhes encante, ou que se conforme à sua crença ou modelo de mundo.
O espiritualista lúcido sabe que o universo e Deus não tem pena de ninguém, porque sabem que o gênero humano só vai pra frente quando tem um leão correndo atrás dele, ou, dito de outro modo, possuímos uma tendência a só evoluirmos diante desafios, desconforto e dificuldades. Entre aprender por amor ou pela dor, a ampla maioria de nós acaba seguindo pela dor.
O espiritualista realmente sábio SABE que não existem vítimas.
Trate as pessoas como merecem, e ninguém escapa ao chicote. William Shakespeare
Espiritualistas optando por políticas de Esquerda, isto é, que vitimizam a população, são um contra-senso, porque se o que a vida quer das pessoas é evolução, não vai ser com migalhas (assistencialismos) que essa evolução vai ocorrer.
Procure saber mais da relação entre Francisco Xavier e seu mentor Emmanuel, e você vai entender o que eu quero dizer.
CLARO que não estou dizendo que todo espiritualista tem que ser de direita, e sim, que é esperado de todo espiritualista uma visão mais holística da existência humana, mais profunda e por isso mesmo, mais cética, racional e ponderada, a qual coloca o ser humano num lugar mais justo dentro da escala universal, com suas muitas particularidades viciosas, e também virtuosas, e não como centro do universo ou como responsável por extinguir todas as injustiças do mundo.
Primeiramente, porque não fomos nós que criamos o mundo desse jeito, e segundo, porque nosso poder de ação é bem limitado.
Mais amor, por favor
Estes espiritualistas New Age pregam o amor como fonte para todo o progresso espiritual.
Falam muito do amor incondicional, por tudo e por todos, que para mim é uma grande utopia.
Na visão deles a situação ideal seria aquele cenário paradisíaco dos testemunhas de Jeová, seres humanos, zebras e leões convivendo pacificamente num belo jardim.
Eles realmente acreditam que bandidos e pessoas rudes vão entender os atos amorosos que recebem e vão se convencer só por isso que estão errados.
Para bandidos, quem age assim é um trouxa a ser lesado. É preciso ter em conta que parte da raça humana não entende a linguagem do amor. O bandido carece de concepções morais e empáticas em relação ao outro, e somente medidas rígidas são capazes de fazê-los tomar consciência.
Quem usa a linguagem da violência para atuar no mundo, só entende a linguagem da contenção física e do cerceamento de sua liberdade para ser barrado.
Se nem sempre Deus tem piedade da humanidade, porque nós devemos ter?
Rejeição aos valores ocidentais
Nem sei o que dizer quando vejo esses muitos espiritualistas de youtube, que vivem criticando o ego, o egoísmo, a ambição material e portanto, o capitalismo, mas não rejeitam um bom dinheirinho entrando em suas contas.
Às vezes, durante meus estudos, me deparo com alguns tipos de terapia interessante. Tempos atrás, encontrei uma terapeuta aparentemente muito competente, inteligente e que mescla abordagens complementares para seus clientes.
Eu realmente entendo que a competência dela tem um valor alto. Ela está cobrando atualmente 800 reais por uma abordagem terapêutica.
Eu realmente entendo que ela merece essa quantia por ajudar os outros, mas dada a realidade brasileira, e a profunda necessidade que nós temos de resolver nossos problemas emocionais, sou levado a concluir:
Se eu tivesse 800 reais, assim, disponível, eu não estaria precisando de terapia.
Enfim, terapia só para ricos meio que foge da proposta humanista da maioria dessas terapias.
Né?
Espiritualidade de turbante
Boa parte dos espiritualistas tem uma fixação por conhecimentos orientais, sejam indianos, tibetanos ou japoneses.
De fato eles têm muito a nos ensinar. Eu sempre fui fã e tenho minha visão espiritualista muitíssimo moldada pela filosofia da Seicho-no-ie. Mas eu nunca gostei de chegar em seus ambientes e ter que me portar como um japonês, mãozinhas juntas para cumprimentar os outros, e aquelas palavras do Shinsokan original e tal. Eu sou chato, eu sei :$
O mundo ocidental têm a disposição correntes espirituais magníficas que são prontamente rejeitadas. Judaísmo, Cabala, Cristianismo, Espiritismo, Xamanismo, Runas, Tarot.
A Bíblia é um livro magnífico em termos de verdades espirituais. Sempre senti uma grande identificação com a visão cristã de muitos aspectos espirituais, tanto é que os textos deste site estão repletos de citações bíblicas.
Porém o cristianismo é rejeitado por boa parte dos espiritualistas, porque se apegam a alguns erros que cristãos cometeram no passado, e que certas denominações cristãs atuais seguem cometendo. E passam a ouvir uns gurus orientais, ou ocidentais com ginga oriental – osho, prem baba, monja cohen etc porque na cabeça deles, essas pessoas são detentoras de uma sabedoria oculta que somente a introspecção e horas de meditação dessas pessoas foi capaz de lhes conferir.
Santo de casa não faz milagre, não é? Mas não é por culpa do Santo, é por culpa do pessoal da casa.
A culpa
A culpa é filha desobediente de uma regra muito exigente e mal amada.
A espiritualidade prega genericamente que devemos nos desprender do ego e seus desejos. Espiritualistas vivem às voltas cheios de regras e manias sobre alimentação, purificação espiritual e desprendimentos de certos hábitos “mundanos”. Daí surge a questão:
Se não se pode viver o que se deseja, então para quê viver?
Viver um eterno não-viver do que se almeja é mesmo evolução?
Será mesmo que Deus nos colocou aqui, diante de bebidas, cigarros, sexo, beleza e diversão, para passarmos o tempo todo tentando viver longe dessas coisas?
Às vezes as alardadas dimensões espirituais da vida e suas “regras” parecem fazer da nossa existência como se estivéssemos dentro de um Porsche 911, que passa dos 300 km/h, numa estrada perfeita adiante, seca, ensolarada, com uma placa de limite de velocidade de 80 km/h.
Comidas naturais e… sem graça
Tem espiritualista que só pensa na comida. E acha que alimentos naturais vão transformar a vida dele.
Acredita tanto em nossa natureza espiritual, mas vive como se sua constituição existencial – e sua saúde – dependesse integralmente de seu corpo físico.
Há um ditado já bem popular sobre isso, no meio espiritualista:
Não somos um corpo físico vivendo experiências espirituais, somos na verdade um ser espiritual vivendo uma experiência física.
Mas parece que o pessoal da espiritualidade natureba esquece disso. Jesus confirmou:
O que entra pela boca não torna o homem impuro; mas o que sai de sua boca, isto o torna impuro. Mateus 15:11
Tem muitos. Estão sempre confusos a respeito dos dois ditados abaixo:
Você é o que você pensa.
Ou…
Você é o que você come.
Sobre a imagem acima: Dois homens primitivos olham um para o outro, e chegam a seguinte conclusão:
Tem alguma coisa errada. Nosso ar é puro, nossa água é pura, nós estamos o tempo todo nos exercitando, tudo que comemos é orgânico e mesmo assim mal conseguimos passar dos 30 anos*.
* Há consenso entre arqueólogos que os homens primitivos muito raramente conseguiam passar dos 50 anos de idade, boa parte morrendo antes dos 40. Apesar de estarem plenamente integrados à natureza, morriam basicamente das doenças que contraíam.
Livre-arbítrio
Livre-arbítrio é uma coisa que, por definição, é impossível dentro de qualquer sistema moral.
Se há regras morais, se há uma salvação, então não há liberdade.
Livre-arbítrio de fato, seria poder fazer o mal sem ser punido.
Se há punição, então não há liberdade plena.
Livrando a concorrência
- Estendi este trecho em outro post. Leia: O Poder dos Arquétipos
Nós, seres humanos, temos conosco um certo mimetismo, que se manifesta de forma muito facilmente perceptível.
Eu vejo por mim: Às vezes, um gesto singelo ou uma única palavra vinda de uma pessoa diante de mim, muda em mim visões que 100 textos não conseguem mudar.
Nós aprendemos muito mais conversando com alguém, e observando e reagindo a uma pessoa real, visível e palpável, do que lendo ou assistindo a uma palestra. É a força didática da imersão numa experiência real.
O salmo 115 afirma, ainda que em tom crítico, que nós nos tornamos como nossos ídolos.
Transforma-se o amador na coisa amada, pela virtude do muito imaginar. Luis de Camões
E você sabe que tanto o judaísmo, quanto o islamismo são religiões que abominam o culto a ídolos.
Talvez porque aqueles povos antigos eram burrinhos e ficavam cultuando bezerros de ouro.
Mas cultuar um ídolo superior, pode ser muito frutífero. É questão de inspiração.
Hoje, as correntes new age dizem que o pensamento positivo é capaz de transformar a vida.
E elas ficam orientando você a usar sua imaginação para se imaginar nas situações que deseja.
Mas as pessoas têm uma dificuldade terrível de usar a imaginação, e muito menos de manter as cenas imaginadas por longos períodos. A verdade é que as pessoas têm uma limitação mental e imaginativa bem acentuada.
Não seria por isso, quem sabe, que os antigos criavam estátuas de personagens divinos, com as cenas marcantes que lhes geravam admiração, para assim estarem sempre diante de figuras reais e visuais que lhes ajudavam a sintonizar com estados imaginativos superiores e assim, quem sabe com o poder espiritual do pensamento, alcançar o que tanto almejavam?
O fato é que às vezes eu tenho a impressão que as religiões monoteístas que cultuam um Deus abstrato são uma forma de manter as pessoas sem conseguir nada.
É uma forma dos poderosos se livrarem da concorrência.
Porque, se somos o que pensamos, então ficar o tempo todo cultuando um deus sem forma, acaba deixando também nossa realidade sem forma.
Se somos o que pensamos, então se queremos ser alguma coisa, precisamos sintonizar o pensamento com a realidade dessa coisa, e sendo assim, ferramentas que nos ajudem a direcionar o pensamento, como imagens, fotos, santinhos, amuletos e outros itens, podem favorecer essa sintonia.
Havia uma deusa romana chamada Fortuna. Era como se fosse a deusa da sorte.
Como é que você sairia do templo depois de ficar alguns minutos cultuando a deusa da Sorte?
Azarado como sempre? ou quem sabe finalmente energizado com as graças da boa sorte?
Eu realmente não sei esta resposta. Isto é apenas uma especulação filosófica.
Tire suas próprias conclusões.
Leia mais em: O Poder dos Arquétipos
Seja você mesmo
Eu não poderia sugerir outra coisa: Questione tudo, inclusive, e PRINCIPALMENTE essas pretensas regras espirituais que pretensos gurus ficam impondo.
Espiritualidade existe para nos trazer PAZ INTERIOR, e não para nos fazer sentir melhores por mera adesão a valores descolados.
Seja você mesmo.
Preserve sua integridade física, emocional e intelectual, mas, cuidando para não prejudicar o bem-estar alheio, priorize seu próprio bem-estar e não deixe de fazer nada que lhe faça bem.
Não deixe jamais de se divertir e de viver sua vida intensamente; não se culpe por não conseguir seguir regras cujos fundamentos e origens você não compreende bem. A vida é curta demais para reduzi-la a adequação sob regras cujos resultados efetivos são pouco claros.
Osho (olha ele aqui) confirma:
Este deve ser o seu método: aprenda a aceitar a vida como ela vem. Quando algo acontecer, aceite; quando desaparecer, aceite.
Quando o prazer vier, aceite-o; quando ele evaporar, aceite.
Permaneça sem julgar, simplesmente uma testemunha silenciosa de tudo.
Este é o segredo mais profundo de todos os budas, de todos os acordados.
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